terça-feira, 20 de março de 2012

Força que Desconheço







  Prestei serviço militar, lembro do forte condicionamento mental a que somos submetidos.
  Exercícios até a exaustão física complementados com “mantras” repetidos sem trégua.

 “Esse sangue é muito bom.
  Já provei não tem perigo.
  É melhor do que café.
  É do meu inimigo.”

  Um, dois ... três, quatro.
  Um, dois ... três, quatro

  Tem alguém cansado?
  NÃO!
  
  Tem alguém com fome?
  NÃO!

  Tem alguém com sede?
  NÃO!

  A tropa da qual eu fazia parte era a Companhia de Comando da Brigada, tinha 64 ou 67 homens, se um único soldado dissesse mesmo por gracejo que estava cansado a marcha aumentava de acordo com a vontade do comandante.

  O “bullying” dos superiores é uma constante.
  Faz parte do treinamento.
  Teve um Tenente Baraldi que virou meu encosto desde o começo.
  Ele colocava apelido em todo mundo, mas os preferidos eram eu e o “Patinho Feio” 😏 meu colega soldado Nelson.
  Tadinho, ele era feinho mesmo.
  Lembro que em uma “missão” (roçar o mato do quartel) algumas abelhas o atacaram.
  Seu rosto inchou, ficou meio deformado.
  O tenente foi informado, olhou pra ele e disse:

  Tenente Baraldi: “Não vejo diferença, é a mesma cara feia de sempre”.

    (Quem rir vai para o inferno ...😂)

  No meu caso ... foi pior ... porque era comigo 😏.
  Meu alistamento nem estava confirmado, o Tenente Irineu passou em revista a tropa.
  Nem farda estávamos usando, fizeram nós ralarmos mesmo com roupas de civis.
  Todos obedecíamos a tudo na tentativa de não cair em desgraça (servir o exército).
  Eu tenho cílios “bem feitos” (vamos dizer assim).

  Tenente Irineu: “Esses cílios são seus ou você é uma Penélope Charmosa?”.

  São meus Senhor!
  (Tinha que falar Senhor)

  A tropa riu muito, com o Tenente Irineu não passou disso.
  O problema é que o Baraldi ouviu...
  A partir dali, para qualquer exercício, eu, “a Penélope”, estava fazendo corpo mole.
  Meu apelido não pegou igual ao do Patinho Feio.
  Qualquer um que me chamasse de Penélope era ignorado totalmente.
  Isso incluía os superiores hierárquicos.

  Foi mais ou menos 1 mês de muito bullying.
  Até que teve o “confronto final”.
  Depois de um dia exaustivo, ainda em formação, o espirito maligno Baraldi veio me “obsidiar”. 😏
  (Agora eu rio, mas no momento foi trágico.)

   Começou com esse negócio de Penélope Charmosa, eu ignorei totalmente.
   (Uma informação importante ... eu estava com forte desejo de suicídio.)
   Deixei o Baraldi em uma situação difícil, tinha muita gente ali, não só a tropa, mas outros oficiais.
   Eu estava ostensivamente desrespeitando a hierarquia, não obedecendo ordens.

  Havia um fosso ao lado do QG, tinha chovido, estava cheio de água, uns 4 metros de profundidade.

  Baraldi: “Soldado pule no fosso”.

  William:  Eu não sei nadar ... senhor.

  Baraldi: “Soldado PULE NO FOSSO!”.

  Eu não disse mais nada, corri e me atirei no fosso.
  Uns três soldados pularam para me resgatar.
  Ficou aquele climão.
  Voltei para formação encharcado e com nariz e garganta ardendo demais pelo quase afogamento.
  Pensei.
  Se o suicídio ocorrer no quartel, mato o Baraldi primeiro...

  Mas depois dessa ocorrência, embora ele pegasse no meu pé, diminuiu bastante a intensidade.
  Sinceramente desejo tudo de bom para ele, não restou nenhuma magoa.
  O apelido de Penélope Charmosa ... morreu afogado no fosso.


 
  Fora do exército...
 
  Ao receber ordem não consigo deixar de pensar, automaticamente verifico se concordo ou não.
  Se meu superior dá uma ordem cumpro pelo respeito a hierarquia sem deixar de querer entender a razão e avaliar a eficiência da medida.  

  Isso em geral é feito internamente, cada um tem seu estilo de liderança, não sou aquele funcionário irritante, sempre questionando tudo.
  Só emito opinião quando tenho sugestão melhor ou diante do que considero "injustiça".
  Já aconteceu de eu pagar dia de funcionário do meu bolso (quando fui encarregado) por não concordar com a decisão do dono da Empresa.

   Não consigo lembrar nenhuma fase da minha vida onde tenha idolatrado alguém ou alguma coisa.
   A não ser na minha infância e adolescência cristã/católica, mas não vamos trazer religião para essa meditação.

 
  Idolatria: Excesso de amor; admiração exagerada por outra pessoa.
  Culto de imagens e/ou das esculturas de santos.


 Mesmo naquelas paixões de adolescente nenhuma moça conseguiu se aproveitar dos meus sentimentos.
  Qualquer solicitação era analisada e submetida a conveniência de fazer ou não.

  O pensador que mais me influenciou foi Sócrates, mas nunca chegou nem perto de alguma adoração.

  O que leva uma pessoa seguir outra sem pensar?
  O que leva alguém seguir uma ideologia sem pensar?

  Não sei, não é da minha natureza.
  A idolatria é uma FORÇA QUE DESCONHEÇO em mim, apenas observo nos outros...











 


 Comentarista:  "William, dizem que os neologismos foram criados no calor de uma garrafa de vinho envelhecida no Sul da França."

 

William: Eu até que gosto.

  No exército um tenente nos chamava de "Mocoreba".

  Ninguém sabia o que era isso.

  Até que um colega perguntou.

  A resposta me fez rir bastante, apesar de estar "depressivo" na minha fase militar.


 

Soldado Noel (vulgo Lagartixa): Tenente, o que significa Mocoreba?

 

Tenente “simpático”: Mocoreba é uma palavra que não significa nada, igual você.


😂😂


 Nota: Neologismo é um fenômeno linguístico que consiste na criação de uma palavra ou expressão nova, ou na atribuição de um novo sentido a uma palavra já existente.

       


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