quinta-feira, 26 de maio de 2022

Rafael Barrett


 

   

 "Enquanto não possuía  nada além da minha cama e dos meus livros, eu estava feliz.



  Agora eu possuo nove galinhas e um galo, e minha alma está perturbada.

  A propriedade me tornou cruel.

  Sempre que comprava uma galinha amarrava-a dois dias a uma árvore, para impor a minha morada, destruindo em sua memória frágil o amor à sua antiga residência.   

  Remendei a cerca do meu quintal, a fim de evitar a evasão dos meus pássaros, e a invasão de raposas de quatro e dois pés.

  Eu me isolei, fortifiquei a fronteira, tracei uma linha diabólica entre mim e meu vizinho.

  Dividi a humanidade em duas categorias; eu, dono das minhas galinhas, e os outros que podiam tirá-las de mim.   

  Eu defini o crime.

  O mundo encheu-se para mim de alegados ladrões, e pela primeira vez eu lancei do outro lado da cerca um olhar hostil.

  Meu galo era muito jovem.

  O galo do vizinho pulou a cerca e começou a corte das minhas galinhas e a amargar a existência do meu galo.   

  Despedi o intruso a pedrada, mas eles pularam a cerca e voaram na casa do vizinho.

  Eu reclamei os ovos e meu vizinho me odeia.

  Desde então vi a cara dele na cerca, o seu olhar inquisidor e hostil, idêntico ao meu.

  Suas galinhas passavam a cerca, e devoravam o milho molhado que consagrava aos meus.

  As galinhas dos outros me pareciam criminosas.

   Persegui-os e cego pela raiva matei um.

  O vizinho atribuiu grande importância ao atentado.

   Ele não aceitou uma indemnização pecuniária.

   Retirou gravemente o corpo do seu frango, e em vez de comê-lo, mostrou-o aos seus amigos, o que começou a circular pela aldeia a lenda da minha brutalidade imperialista.

  Tive que reforçar a cerca, aumentar a vigilância, aumentar, em suma, meu orçamento de guerra.

  O vizinho tem um cão determinado a tudo; eu pretendo comprar uma arma.

  Onde está minha antiga tranquilidade?

   Estou envenenado pela desconfiança e pelo ódio.

  O espírito do mal tomou conta de mim.

  Eu era um homem.

  Agora eu sou um dono."


("Galinhas", do anarquista Rafael Barrett, Paraguai, 1910.)


 


    Não sei porque tanto drama.
  Vire mendigo e seja feliz...

  O problema desse daí é paranoia... 😊


  “Enquanto não possuía nada além da minha cama e dos meus livros, eu estava feliz.”

 


  Quem pagou pela cama, livros, como sustentava a moradia!?
  Se eram seus pais como eles conseguiam se manter?
  Criando galinhas, cultivando em uma pequena propriedade?
  Sem ficarem com essa paranoia de deixar de ser humano para passar a ser "dono" e criando encrenca com todo mundo.

  Por vezes acho esses caras os maiores "171".
  Fazem de tudo para ficar na "vagabundagem" e conseguir quem os sustente.

  Mas é o tal negócio.

  Para o malandro se dar bem tem que encontrar um otário...


   "O verdadeiro fundador da sociedade civil foi o primeiro que, tendo cercado o terreno lembrou-se de dizer "isto é meu" e encontrou pessoas suficientemente simples para acreditá-lo.
  Quantos crimes, guerras, assassínios, misérias e horrores não pouparia ao gênero humano aquele que, arrancando as estacas ou enchendo o fosso, tivesse gritado a seus semelhantes: "evitai ouvir esse impostor; estareis perdidos se esquecerdes que os frutos são de todos e que a terra não pertence a ninguém"
  (Jean Jacques Rousseau)

 

Vamos meditar sobre isso?















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3 comentários:

  1. Meu deusinho reencarnacionista.
    Esse Rafael é o Sr.Hosaka em sua última vida.
    Repare na semelhança da redação.
    Vou procurar esse personagem na wiki. 😀

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  2. Não tive a intenção de dar o espaço longo que dei na primeira linha.
    Não sei como isso aconteceu.

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  3. Tenho receio que a Google descontinue o serviço de blogs.
    A manutenção da ferramenta é precária.
    O espaço para comentários até evito de usar, não tem recurso nenhum, até notificações demoram para chegar.
    .
    Agora mesmo vi que alguém comentou um texto em 17 de Maio e só agora fui notificado.

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