segunda-feira, 12 de outubro de 2015

Aposentados Vagabundos

  O título é forte, mas não se impressionem com ele, é só para chacoalhar as mentes.

  Gostamos de criticar políticos, esquecemos que eles são gente como a gente nem melhores nem piores que a média do comportamento cultural brasileiro.

  O indivíduo crítica o político que abusa dos privilégios, mas será que se comportaria mais eticamente na mesma situação?

  Minha mãe poderia ter estudado mais, mas estudou pouco, apenas concluiu a quarta série.
  Embora de família muito pobre nada a impedia de concluir ao menos o colegial, havia escolas publicas perto de casa.
  Fazer faculdade seria um enorme desafio, mas nos anos que ela viveu sua juventude, concluir o ginásio e ter um pouco de juízo já lhe garantiria bom padrão de vida.
  Apesar de viver sua adolescência em tempos que presava-se mais pela moral e bom costume ... engravidou aos 15 anos.
  Depois com uns 17 anos teve eu.
  Nasceram mais 5 com duas mortes ainda bebês.
  Com tantos filhos e pouco estudo minha mãe conseguia aqueles empregos que exigem menor especialização, basicamente trabalhou como auxiliar de limpeza, auxiliar de cozinha, balconista ...
  No início da década de 80 prestou concurso público, foi contratada como servente escolar, nessa época não se exigia muito, bastava ler e escrever.
  Antigamente tinha "concursos internos", em um desses foi transferida para fazer café na Secretaria da Fazenda do Estado.
  Minha mãe teve sorte.
  Nos anos 80 o serviço público começou a passar por uma valorização jamais vista.
  A Secretária da Fazenda terceirizou o serviço de limpeza, minha mãe foi alçada a serviços administrativos.
  Isso mesmo.
  Um posto que hoje em dia você precisa estudar muito e concorrer com milhares de pessoas, caiu no colo de pessoas com baixíssimo nível de estudo.
  As regalias foram se somando.
  Fora os aumentos do dissídio que começaram a ser generosos ainda tinha aumentos diferenciados a cada 5 anos.
  Podia-se ter 6 faltas abonadas no ano, fora férias, recesso de final de ano e emendar todos os feriados possíveis e imagináveis.(Ponto Facultativo)

  Se minha mãe precisasse sair mais cedo ... tudo bem.
  Alguma colega preenchia o cartão, em outro dia o favor era retribuído.
  Mesmo com essa melhora substancial nas condições de trabalho minha mãe vivia reclamando, nada do que o Estado desse era suficiente.
  No início ela gostava do Franco Montoro, foi nessa fase que saiu da limpeza e foi para o administrativo.
  Mas no final do Governo já o detestava e detestou todos os Governadores que o sucederam.

  Para os servidores um Governador só é bom se dá aumentos substanciais acima da inflação e possibilita cada vez mais mordomias e benefícios.

  Como os servidores se tornaram insaciáveis e tem um limite de quanto se pode cobrar de impostos ... via de regra servidores e governadores na maior parte do tempo seguem em lados opostos, os primeiros exigindo muitos gastos e o Governador propondo corte de gastos.

  Não é que o Governador não queira ceder ao populismo é que realmente não há dinheiro, é vestir um “movimento social” e desvestir outro, é aumentar os salários da Educação e congelar os salários da Segurança.

  Na década de 90 por motivo de saúde minha mãe começou a faltar muito ao serviço, mais do que o habitual.
  Mais tarde descobriu que o coração estava fraco , foi indicado a colocação de marca-passo ... tudo pago pelo dinheiro dos impostos e contribuições do SUS.

  O fato é que de 199X até minha mãe se aposentar em 200X (não lembro as datas ao certo ) ela trabalhava bem pouco, eram atestados médicos longos sempre renovados.
  Minha mãe foi aconselhada a se aposentar por invalidez, mas não aceitava, pois seu salário seria diminuído.
  Ela preferia ganhar sem trabalhar...

  Toda essa introdução foi só vaselina, agora o texto começa de fato.

     

 “A maior ambição do ser humano é querer colher aquilo que não plantou.”

[Adam Smith]

 

 

  Na empresa que estou, inúmeros servidores exercem o direito de ganhar sem trabalhar.
  Eles têm o direito de se aposentar e continuar trabalhando.
  Aposentar eles se aposentam.
  No papel continuam trabalhando.
  Na prática a realidade é bem outra.

  Com a renda da aposentadoria já garantida, tentam garantir o salário da empresa trabalhando o mínimo de dias possível.
  Atestados médicos tornam-se uma constante.
  Vão ao médico reclamando de tonturas ou dores localizadas, os atestados saem fácil.
  Até porque é muito difícil depois dos 60 anos não ter nenhuma complicação como diabetes, hipertensão, sequela de alguma coisa, dores na coluna ou em algum músculo usado por muitos anos.
  O corpo é uma máquina biológica, como toda máquina mais cedo ou mais tarde começa a falhar.
  O problema é detectar por meio de exames até que ponto um desgaste impede a pessoa de trabalhar.
  O médico fica muito dependente do indivíduo dizer o que está sentindo, o indivíduo pode dizer qualquer coisa.

  Na Empresa vejo muita gente pegando atestados prolongados dizendo não conseguir trabalhar, mas passear no Shopping ou fazer viagens turísticas ... a doença não impede.
  Tem gente que diz não suportar mais o computador, mas não sai do Face e do “Zap zap”!
  Doença seletiva hein!?
  Tem doença ainda mais seletiva.
  Ela começa no final de Novembro e vai até depois do Carnaval, o cidadão volta e pega seu mês de férias ...
  Tudo perfeitamente legal.
  Não esqueçamos as tradicionais greves.

  O fato é que muitos funcionários enforcam pelo menos 3 meses de trabalho e recebem como se trabalhassem normalmente.

  Essas pessoas reclamam dos políticos, mas imaginem elas no Congresso Nacional podendo votar mais benefícios para elas mesmas!

  No serviço público licenças psiquiátricas são bem comuns.
  Tem gente que esta registrada no meu setor, mas eu nunca vi ... já estou na empresa há 4 anos.

  A pessoa faz uma ceninha, ganha atestado de estresse.

  Por vezes não dá licença, mas ela é premiada com serviços mais leves, menor responsabilidade sem redução de salário é claro.
  Tem gente que recebe atestado psiquiátrico para não lidar diretamente com o público o supervisor/diretor tem que inventar uma ocupação para pessoa.
  O incrível é que essa pessoa que não pode ter contato direto com o público faz bico no comércio da família, vende Natura, vende Avon.

  Minha mãe tinha licença para não trabalhar, mas em casa vendia bijuterias, cosméticos, roupas.

  Na empresa há casos surreais que só são possíveis no serviço público.
  Dependendo do regime de trabalho do funcionário ao se aposentar ele não precisa devolver o crachá funcional.
  É, ele tem entrada livre enquanto viver, com direito a almoço, janta, transporte gratuito...
  O cara não tem nada para fazer em casa fica passeando pela empresa.
  Uma pessoa nova chega não tem armário, mas o “funcionário” que não trabalha tem.

  Esse texto vai me indispor com muitos conhecidos, não me importo, entenda porquê, veja um exemplo:

  Tem um posto onde é feito o controle de visitas a pacientes internados.
  Para funcionar “satisfatoriamente”, você que paga impostos ser razoavelmente bem atendido, esse setor precisa de 4 pessoas.
  Com tantas licenças médicas, na maior parte do tempo opera com 3 e não raro 2.
  Claro que o atendimento fica comprometido e quem vai trabalhar trabalha muito mais.
  Sábado e Domingo são os dias com mais visitantes, cerca de 800.
  Várias vezes ficou apenas eu e mais um funcionário para atender esse grande fluxo de pessoas.

  Você acha que algum dos “companheiros” de trabalho que ficarem indignados com esse texto se preocupam com meu desgaste?
  Ninguém tá nem aí.
  O cidadão está em casa curtindo a família, nem lembra que eu existo.
  Está no churrasco esquece que existe empresa.
  O importante é que dia 6 o salário estará depositado, 25 tem vale alimentação.
  Dane-se quem trabalhou sobrecarregado ou o usuário do SUS que foi mal atendido por falta de funcionários.







  Deveria ter uma lei no serviço público onde o servidor já aposentado que claramente está sendo um estorvo seria afastado compulsoriamente sem direito a indenizações.

  Se a ausência do trabalho supera 30 dias no ano e não é muito bem justificada o caso deveria ir para analise se compensa manter esse funcionário.
  Se é uma cirurgia de apêndice (só um exemplo) com recuperação plena tudo bem.
  Se o cidadão tem problema crônico de pressão, coluna, tendinite ... doenças “misteriosas” (depressão) que o levam a constantes afastamentos, deveria ser afastado compulsoriamente para o bem do serviço público.

  O servidor que não está aposentado, mas claramente não cumpre com suas funções deveria ser demitido, nesse caso, com direito a indenizações trabalhistas.

 
A estabilidade no Serviço Público nos moldes que esta deveria ser revista urgentemente.

  Hoje em dia temos muitos recursos tecnológicos para provar por A + B que o funcionário é relapso ou ineficiente.

  Sou a favor de reuniões disciplinares com a chefia serem gravadas em áudio e vídeo para se preciso serem apresentadas em juízo.
  Há inúmeros casos do funcionário ser chamado atenção por falhas graves, manda o supervisor a peta que puril ... e não dá nada.

  O supervisor, diretor, Heitor, Governador, Presidente da República não tem “na pratica” poder para demitir/exonerar um funcionário público a não ser em casos extremamente graves ... assassinatos, roubos ... crimes graves muito bem comprovados.
  O caso tem que ser tramitado e julgado até última instância onde seja possível recorrer.

  O sonho dos funcionários aposentados “problemas” que continuam “trabalhando” é serem demitidos.

  Não é para menos, pelas normas atuais caso o Governo os demita ganharão uma gorda indenização, estou falando de 400 mil para os salários mais baixos, para os que ganham mais ... imaginem, o céu é o limite.
  A situação é ótima para eles.
  Já tem a aposentadoria garantida, nos últimos anos trabalham quando querem e como prêmio pela estorvo levam 400 mil!


“Brasil um país de poucos.”

 
Claro que quem banca toda essa festa é você que por N motivos não esta no grupo seleto do funcionalismo publico brasileiro.
  Afinal, com tanta diferenciação, a maioria da população tem que pagar muito imposto, a grana tem que sair de algum lugar.
  Pense nisso quando se posicionar radicalmente contra privatizações ou ser contra reformas significativas no funcionalismo público.


  E a situação do aposentado que realmente tem dificuldades físicas, não consegue mais trabalhar com a frequência esperada?

  Caraca!
  A aposentadoria existe para isso, se não aguenta mais trabalhar, não trabalhe.
  Mal ou bem o cidadão já tem garantido uma renda, os filhos a certa altura da vida já devem estar criados, se o idoso teve juízo pelo menos tem casa para morar e algumas economias.

  A maioria das doenças da velhice são atendidas no SUS, os remédios também são bancados com o dinheiro dos impostos.

  O aposentado que continua no serviço público sem trabalhar dá um prejuízo enorme.
  Tira a vaga de um cidadão saudável que sairia da fila do desemprego e trabalharia com muito mais eficiência.
  Sobrecarrega o funcionário público correto que cumpre com suas funções.
  Dá prejuízo para a Estatal que desembolsa o pagamento integral de um funcionário que não trabalha ou trabalha bem menos dias do que deveria.

  Quando me aposentar pretendo continuar trabalhando, mas sou um funcionário público correto, só continuarei se estiver saudável e não for um estorvo para empresa e companheiros de trabalho.

  Não sou uma exceção à regra quando me comporto corretamente, tem muito trabalhador correto, gente que dá gosto trabalhar ao lado.
  Sou uma exceção à regra no sentido de ser correto e cobrar correção.

  Os trabalhadores corretos que eu conheço fecham os olhos para incorreção de outros.

  Não me incomoda muito o fato de tantos brasileiros de todas as idades quererem ganhar sem trabalhar, é da natureza de muitos humanos, como observou o companheiro Adam Smith.

  Me incomoda que a maioria correta permita que isso aconteça.😟

 ⏩Luta de Classes


Nota: Se você é um funcionário que trabalha corretamente de certo não vai ficar indignado com esse texto, se ficou indignado...






 

 

  29/01/21 – Esse texto foi escrito em 2015.

  Em 2019 teve a reforma da Previdência.

  Fiquei satisfeito por ocorrer algumas mudanças necessárias para o país, mas definitivamente eu devo ter dançado poli dance na cruz...

 

 Se a reforma ocorresse em 2020 eu teria direito a algumas vantagens sem precisar “pagar pedágio”.

  Já perdi aí.

  Paguei pedágio e por um erro de algum funcionário público do INSS não faço ideia de quando vou poder me aposentar.

  Portanto, não perca seu tempo me desejando o mal.

  De certo deve ter coisas mais importantes para fazer do que ficar chutando cachorro morto ...

 

 

 


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